Tribo da Amazônia contradiz noção de que contar é capacidade 'inata'
Matéria divulgada na BBCBrasil. 17/07/2008.
Os índios expressam quantidades relativas, não números específicos
A língua falada por uma tribo amazônica que não tem palavras para designar números contradiz a noção de que o ato de contar seria inerente à capacidade cognitiva de seres humanos, afirma um estudo do Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT).
A língua da tribo Pirahã, que vive às margens do rio Maici, em Rondônia, vem sendo estudada há vários anos por suas características singulares.
No estudo recente, publicado na revista científica Cognition, o professor Edward Gibson afirma que os Pirahã não têm palavras para expressar o conceito de "um" ou de outros números específicos.
Segundo a pesquisa, a tribo teria apenas expressões para designar quantidades relativas, como "muitas", "poucas" ou "algumas".
Segundo Gibson, é comum assumir que contar é uma parte inata da capacidade cognitiva humana, mas "aqui está um grupo que não conta. Eles poderiam aprender, mas não é útil em sua cultura, então eles nunca aprenderam".
"A pesquisa oferece provas de que as palavras que designam números são um conceito inventado pelas culturas humanas conforme a necessidade e não uma parte inerente da linguagem", disse Gibson.
Experimento
A pesquisa partiu de um estudo publicado em 2005 pelo lingüista Dan Everett, que viveu com os índios Pirahã entre 1997 e 2007.
A pesquisa de Everett dizia que a tribo tinha palavras para expressar a quantidade "um”, "dois" e "alguns".
Gibson, no entanto, fez um experimento no qual a equipe apresentava um objeto ao índio e adicionava um novo objeto de cada vez até completarem 10.
Durante o processo, os pesquisadores pediam para que os índios contassem quantos objetos estavam expostos.
A equipe observou que a palavra que anteriormente foi identificada como se representasse o número "um" foi usada pelos Pirahã para expressar qualquer quantidade entre um e quatro.
Além disso, a palavra antes associada ao número "dois" foi usada pelos índios quando cinco ou seis objetos estavam expostos.
"Essas não são palavras para contar números. Elas significam quantidades relativas", afirmou Gibson.
Segundo ele, essa estratégia de contagem não havia sido observada antes, mas poderia ser encontrada em outras línguas na qual se usam as palavras um, dois e alguns para se contar.
A pesquisa de Gibson faz parte de um amplo projeto que investiga a relação entre a cultura da tribo Pirahã com sua cognição e linguagem, com base nos estudos do lingüista Dan Everett.
Tribo da Amazônia põe em xeque teoria de Chomsky
Matéria divulgada na BBCBrasil. 17/07/2008.
Descobertas de Everett foram descritas em artigo da "New Yorker"
Um americano que pesquisa desde os anos 70 uma tribo da Amazônia afirma que a língua falada pelos índios que analisou coloca em xeque uma teoria elaborada pelo famoso lingüista Noam Chomsky sobre uma regra que rege todas as línguas faladas no mundo.
O lingüista Dan Everett e sua mulher estudaram a tribo Pirahã, que vive às margens do rio Maici, em Rondônia, e fala uma língua que aparentemente não é relacionada a nenhuma outra.
Um artigo sobre a tribo Pirahã, descrevendo a descoberta de Everett, foi publicado na última edição da revista americana The New Yorker.
Segundo Everett, os Pirahã não demonstram fazer uso de um recurso lingüístico que consiste em inserir uma frase dentro de outra do mesmo tipo, como quando o narrador combina pensamentos ("o homem caminha pela rua", "o homem está usando uma cartola") em uma única sentença ("O homem que está usando uma cartola está caminhando pela rua").
Chomsky argumenta que esse recurso é um marco comum a todos os idiomas.
"Bomba"
Steven Pinker, cientista da Universidade de Harvard, afirma que a teoria de Everett é "uma bomba atirada em uma festa" e, durante meses, foi discutida nos meios acadêmicos.
Everett, que já foi discípulo de Chomsky, insiste que não apenas os Pirahã são um "exemplo contrário" à sua teoria de Gramática Universal, mas também que não são um caso isolado.
"Acredito que uma das razões de não termos encontrado outros grupos como este é porque, simplesmente, nos falaram que não era possível", disse.
Os Pirahã usam apenas oito consoantes e três vogais. Por outro lado, seu idioma possui grande variedade de tons, sílabas longas e sílabas fortes.
Fonemas complexos
Os índios podem usar estes recursos com vogais e consoantes juntas, cantando, cantarolando baixo ou assobiando conversas inteiras.
Mas os Pirahã não possuem palavras para designar números ou quantidades – termos como "tudo", "cada um", "cada", "muito" ou "pouco" -, algo que era considerado comum a todas as línguas.
Lingüistas acreditam que tais termos são blocos comuns, básicos, do conhecimento humano.
A língua da tribo também não tem nenhum termo fixo para cores, não tem tempos verbais perfeitos, e os índios não têm tradição em artes ou desenho.
Os fonemas (os sons que constroem as palavras) da linguagem dos Pirahã são extremamente difíceis, com sons lamentosos nasais, respirações curtas e precisas e sons feitos com estalos ou simplesmente por bater os lábios.
A natureza tonal do idioma também confunde: o significado das palavras depende de mudanças de volume. Por exemplo: as palavras para "amigo" e "inimigo" diferem apenas no volume de uma única sílaba.
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